Google+ Canal Brasília: Crônica: Em todas as noites brasilienses

17 de fevereiro de 2012

Crônica: Em todas as noites brasilienses

Por Fabrício Fernandes



Cheguei há cinco anos para morar em Brasília. Sem olhar devidamente para a precariedade da minha chegada - emprego garantido como jornalista, mas sem moradia certa - num primeiro olhar, a Capital pareceu setorizar nossa compreensão sobre ela. Há lugar para tudo: comércio, moradia, indústria, lugar para caminhar, etc. Mas com o tempo, a cidade começa a mostrar certa estranheza.

Foto: Fabrício Fernandes
Confesso ter preguiça de falar sobre a tal monumentalidade desta cidade. Então... para tentar desvendar um estranho vento que sopra corriqueiramente em todas as noites brasilienses, comecei a andar por ela, a despeito dos meus joelhos. Andei por entrequadradas desérticas, pelo parque em seus passeios com poucos passantes, por ruas sem calçadas, margeando vias largas e transitadas por milhares de carros e seus motoristas desatentos – andei até nada encontrar. A não ser quando avistei grandiosas imagens numa planície aberta, na horizontalidade do chão seco, o céu límpido e claro espalhado sobre a cabeça, o Sol quente. E do encontro com uma página em branco, deitada sobre a mesa de casa, ao encontro com os desérticos dias, o que ficava era consciência de uma certeza: haveria a hora em que abandonaria tudo aquilo.

Abandonaria a redação do jornal; um tal Kenedy, o morador de rua errante com quem trocava ideias perdidas; abandonaria o escritório montado num dos cômodos de casa; os papéis com meu desespero e gozo rabiscados sobre a mesa; as janelas com vista para o cume da torre da cidade; os vinhos e a embriaguez noturna; as canções mais tristes e as mais festivas; os amigos que me visitavam e nos regávamos de rock e cerveja; a fumaça e as cinzas de cigarro espalhadas pela casa; os bares com suas pistas de danças e música moderna, eletrônica; os subsolos underground em que topei com gente interessante, outras, nem um pouco; o medo de precisar do funcionalismo público, do dinheiro, da performance social com políticos e jornalistas; os beijos molhados que dei e  não dei em belos rapazes, nos lugares macios da casa,  enfim... tudo que foi novo, velho, e de uma forma ou outra, inserido ou excluído, inteiro ou despedaçado, tudo com o que deliciosamente pude interagir, e viver, corajosamente ou acovardado. Tudo que de Brasília a mim pertence. Agora eis-me aqui noutra cidade: repetindo diferentemente...

... e escutando O oposto do osso com Bárbara Eugênia.

Confira outros canais do Fabrício Fernandes
Livro para download: oimpulso.wordpress.com 
Blog: blobfabriciofernandes.wordpress.com
Blog de foto: www.flickr.com/photos/fabricio-fernandes
E-mail: blogfernanesferreira@gmail.com


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradecemos seu comentário. Volte sempre que desejar.